terça-feira, 6 de outubro de 2009

Direitos humanos



por David Moisés

A impunidade e o medo são capazes de transformar cidadãos de bem em carrascos aplicadores da lei de Talião. Talvez seja essa a origem de um fenômeno curioso: o discurso pronto e unívoco contra 'a turma dos direitos humanos'.

Por 'turma dos direitos humanos', segundo este conceito difundido, leia-se um vasto grupo heterogêneo de pessoas que

1) acham que a polícia não pode arrombar sua porta sem motivo e sem mandado, só porque você é pobre;

2) acham que a polícia não pode humilhar (e estapear, e prender etc) seu filho adolescente na rua só porque ele é ou aparenta ser um garoto de periferia, na cor da pele ou no estilo das roupas;

3) acham que as autoridades devem agir com inteligência e eficácia para identificar, julgar rapidamente e tirar de circulação os delinqüentes, criminosos e facínoras, dando-lhes o encaminhamento adequado para que não voltem às ruas como fonte de risco;

4) acham que as autoridades erram com frequência;

5) acham que as autoridades abusam de seu poder, punindo com violência alguns e sendo benevolente com outros...

A 'turma' é, na verdade, a sociedade civil que espera ter o direito de viver com dignidade. Mas é intrigante que, nela própria, tantos se voltem contra seus interesses, sobretudo quando a sede de justiça fica forte demais, pendendo para a sede de vingança.

'Aqueles que mais necessitam da defesa dos direitos humanos, por vezes, são os mesmos que, de maneira extremamente vulgar, falam: 'lá vem a turma dos direitos humanos'', diz o historiador Marco Mondaini.

Pesquisador do tema, ele faz seu pós-doutoramento pela Universidade de Florença e acaba de lançar Direitos Humanos no Brasil*, publicado pela Unesco.

Nesta entrevista (que publico em partes a partir de hoje), Mondaini explica como o discurso se cristalizou e que implicações isso traz para a sociedade.


NÓS - No Brasil, a luta pelos direitos humanos foi importante em épocas em que cidadãos comuns eram ameaçados por regimes de exceção, que vitimaram inocentes, condenando e punindo sem investigação nem julgamento. Hoje, o conceito de direitos humanos aparece com frequência como um rótulo para aqueles que 'defendem bandidos', ou 'a turma dos direitos humanos'. Por que isso ocorreu?


MARCO MONDAINI - Esse pode ser considerado um exemplo claro das continuidades existentes no decorrer dos processos históricos. A vulgata "direitos humanos como defesa de bandidos" nasce no decorrer da ditadura, mas se refuncionaliza à medida que o país se redemocratiza, passando a ser utilizada contra as novas ações levadas a cabo seja pelos novos governadores eleitos no início dos anos 1980, seja pelos novos movimentos sociais que se multiplicam no mesmo período.

Lembro bem como, no decorrer do primeiro governo de Leonel Brizola, no Rio de Janeiro, a expressão reverberava à medida que eram tomadas decisões voltadas para a transformação dos aparatos policiais herdados da ditadura, isto é, medidas que fossem capazes de fazer com que tanto a polícia militar como a polícia civil não atropelassem os direitos civis das camadas mais subalternizadas da sociedade. Em poucas palavras, a intenção de Brizola - e esse é apenas um exemplo possível - era fazer com que os policiais se adequassem ao Estado de Direito Democrático que se afirmava no País. E para que isso se realizasse, dever-se-ia partir do núcleo fundamental contido na doutrina dos direitos humanos - o direito à privacidade do lar.

Em suma, a ordem era para que as investidas policiais nas favelas cariocas fossem pautadas pelo respeito aos lares dos seus moradores.


Leia também:
Direitos humanos e a defesa dos bandidos
Espírito de direito versus espírito de vingança

* São Paulo, 2009, 144 páginas, Unesco/Editora Contexto, ISBN: 978-85-7244-422-4

Um comentário:

Anônimo disse...

noooooooosssssssaaaa!!
ele arraaaaaaaasa!!!

 
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